quinta-feira, 17 de junho de 2010

REVESES À QUESTÃO TERRITORIAL NA REGIÃO DE IRECÊ

REVESES À QUESTÃO TERRITORIAL NA REGIÃO DE IRECÊ, BAHIA
VITOR DE ATHAYDE COUTO; ALYNSON DOS SANTOS ROCHA;
UFBA
SALVADOR - BA - BRASIL
vitor@ufba.br
APRESENTAÇÃO SEM PRESENÇA DE DEBATEDOR
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL E RURALIDADE
REVESES À QUESTÃO TERRITORIAL NA REGIÃO DE IRECÊ, BAHIA
Área temática: 11 – Desenvolvimento Territorial e Ruralidade
Apresentação com presidente da sessão e sem a presença de debatedor
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REVESES À QUESTÃO TERRITORIAL NA REGIÃO DE IRECÊ, BAHIA
Resumo
O uso da expressão território ganha espaço no Brasil com a nova orientação política federal, a
partir de 2003. Nesse contexto, as ações estratégicas do Estado para o desenvolvimento
tendem a não mais considerar o município isoladamente. Como estímulo, tem-se a liberação
de recursos vinculados ao território pelas instituições públicas de crédito e financiamento. No
entanto, a permanência de práticas como a liberação de recursos mediante o grau de
articulação política dos municípios causa desconfiança e desmotivação quanto à manutenção
do território. Surgem grupos de municípios que se articulam entre si de forma independente.
Neste artigo analisam-se esses fatos apresentados como reveses à questão territorial. A partir
das experiências na região de Irecê (Bahia) observa-se que ainda existem ações objetivando a
melhor compreensão e funcionamento do território, como por exemplo, a capacitação dos
representantes municipais e a imparcialidade das instituições internas com poder de decisão.
Percebe-se que, executando-se tais ações, tornam-se possíveis a viabilidade administrativa e a
manutenção do território.
Palavras-chave: desenvolvimento, território, questão territorial, Irecê, Bahia.
1. Introdução
A utilização de expressões como articulações intermunicipais, questão territorial ou
simplesmente território, ganha espaço com a mudança da orientação política federal no Brasil,
a partir do ano 2003. A identificação de regiões com realidades e problemáticas similares
resulta em ações estratégicas que consideram não mais o município isoladamente. Como
elemento estimulador para essa visão do desenvolvimento, instituições públicas de crédito e
financiamento passam a vincular, por exemplo, a liberação de recursos, a planos que integrem
municípios, mantenham espaços comuns de discussão das alternativas locais e sejam
potencialmente positivos para toda a região. A criação de um órgão específico como a
Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Ministério do Desenvolvimento Agrário,
e as movimentações para viabilizar os territórios administrativamente, demonstram o interesse
em diferenciar a condução das ações visando ao desenvolvimento regional brasileiro.
Entretanto, a execução e operacionalização do território não estabeleceram completamente na
base do processo (os agentes) a necessidade de se abandonar práticas, disputas e segregações
políticas, em favor do interesse comum de um determinado conjunto de municípios. São
perceptíveis ocorrências como o atraso/rapidez do encaminhamento de projetos de
agricultores familiares alinhados/não alinhados à corrente político-partidária dominante ou a
concentração do poder nos chefes dos executivos municipais. A liberação de recursos também
tem sua velocidade mensurada pelo grau de articulação dos agentes municipais em âmbito
federal e/ou estadual. Note-se que a permanência dessas práticas causa desconfiança e
desmotivação quanto à manutenção do território, uma vez que as metas originais de
desenvolvimento, de forma igualitária, etc., não são observadas (explicitamente) na prática. A
tendência ao surgimento de grupos municípios, articulando-se entre si e buscando, de forma
independente, ajudas para suas demandas, pode se constituir em um revés ao território.
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A região do município de Irecê, no semi-árido da Bahia, também integra as discussões sobre
questão territorial. Outrora grande produtora de grãos, como feijão e milho – mas que, devido
a questões climáticas e mercadológicas diversifica sua produção agrícola em direção às
olerícolas (cenoura e beterraba), com destaque também para a cultura da mamona, fruticultura
e pecuária – a região apresenta algumas iniciativas territoriais que procuram incrementar a
capacidade de organização dos segmentos econômicos e sociais locais. Tem-se a tentativa de
unificação dos conselhos gestores – exigidos por instituições como condição à liberação de
recursos financeiros – de Presidente Dutra, São Gabriel e Uibaí, facilitando a implementação
de ações coordenadas nos três municípios. Não obstante a proposta tenha forte motivação
prática – para evitar que esforços de um mesmo indivíduo sejam dispersos nos vários
conselhos e reuniões – , o fato já sinaliza uma percepção territorial. Some-se ao Fórum
Regional de Debates de Irecê, criado para aglutinar, em um mesmo espaço, distintos
interesses da sociedade civil e do Estado, na discussão dos caminhos para a região. Sua
natureza democrática compreende entrave ao seu funcionamento, pois deparam-se interesses
contraditórios, resistências e outros comportamentos nocivos à iniciativa.
O estabelecimento de territórios no estado em 2003-2004, a partir dos trabalhos no âmbito da
SDT, apresenta a região como o Território de Irecê, composto por dezenove municípios que já
mantêm proximidade geográfica, sócio-política, econômica e ambiental. A maior integração
dá-se com a Plenária, onde são realizadas as deliberações entre os representantes dos
municípios e da Comissão que seleciona e encaminha as propostas para as instituições
federais e/ou estaduais. Sua composição e condução – parcial em relação às forcas políticas
emergentes, segundo representantes locais – desencadeia soluções alternativas daqueles não
contemplados significando a possibilidade desagregação do território.
Neste artigo analisam-se esses fatos apresentando-os como reveses à questão territorial.
Paralelamente, objetiva-se identificar as dificuldades enfrentadas no processo de consolidação
de uma entidade administrativa nascente. Considerando-se os objetivos do território, as
observações feitas por representantes de agricultores e outras lideranças locais – durante o
mês de agosto de 2005 – revelam a necessidade de se corrigir as ações em várias áreas.
Citam-se o processo de elaboração e definição das prioridades a serem atendidas e a
capacitação dos representantes municipais. Destaca-se a necessidade do maior entendimento
do conceito e operacionalização do território pois, devido à profusão de instituições que
passam a adotar o termo, não raro verificam-se confusões e interpretações equivocadas. Nas
seções seguintes discute-se a gênese do território em Irecê, abordando as experiências do
conselho unificado, do Fórum, e sua atual conformação. Em seguida têm-se as assimetrias
políticas geradoras de desconfianças e dos reveses mencionados. Nas considerações finais
entende-se que, embora os entraves estejam presentes, do território emergem as soluções.
Estas podem significar a viabilidade administrativa e manutenção do Território de Irecê.
2. Gênese do território: experiências da Região de Irecê.
A Região de Irecê, no semi-árido baiano, apresenta trajetória de desenvolvimento que
combina a necessidade de diversificação das atividades econômicas, essencialmente
agropecuárias, com o novo arcabouço territorial que domina o ambiente decisório local.
Formada por um conjunto de pequenos municípios próximos geograficamente1, a região, dos
1 Segundo a Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI, 2005), a Região Econômica de
Irecê é formada pelos seguintes municípios: América Dourada, Barra do Mendes, Barro Alto, Cafarnaum,
Canarana, Central, Gentio do Ouro, Ibipeba, Ibititá, Irecê, Itaguaçu da Bahia, João Dourado, Jussara, Lapão,
Mulungu do Morro, Presidente Dutra, São Gabriel, Uibaí e Xique-Xique.
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anos 1980 até meados dos anos 1990, ganha destaque com a produção de grãos,
particularmente o tri-consórcio feijão-milho-mamona. Com o declínio da produção agrícola
em função de problemas como perdas de safras – conseqüência das recorrentes secas –,
oscilação de preços dos grãos, e, principalmente, pela redução gradativa dos serviços
governamentais de apoio (crédito e financiamento), os agricultores passam a explorar outras
atividades. A diversificação se dá através de culturas irrigadas a partir dos anos 1990 como
olerícolas (cenoura e beterraba) e fruteiras, destacando-se a pinha (ou fruta-do-conde).
Somem-se, nesse contexto, os pequenos cultivos de subsistência de feijão, milho e mandioca.
A pecuária complementa o sistema agrário da região: gado-policultura. Destacam-se a
bovinocultura, caprinovinocultura e a suinocultura. Geralmente, essas atividades são
praticadas em pequenos espaços, uma vez que se trata de uma região onde predominam
pequenas propriedades – aproximadamente 70% dos estabelecimentos agropecuários possuem
áreas abaixo de 10 hectares. Esse fato reforça a significativa participação da agricultura
familiar na economia regional. A estrutura fundiária origina-se no processo de ocupação,
determinada, em parte, pelas qualidades naturais da região (tipo de solos, presença de rios) e
pela forte atuação do Estado. Com as políticas de modernização agropecuária executadas, o
Estado promove intensas transformações na organização da base produtiva, nas relações
sociais e na configuração do espaço regional. Neste processo de modernização, a cidade de
Irecê concentra a maior estrutura de serviços e atividades econômicas, para onde convergem
pessoas e mercadorias, firmando-se como pólo regional (CAR, 2002).
Os problemas enfrentados pelos agricultores são bastante similares aos freqüentemente
observados em outras regiões do semi-árido baiano. No aspecto técnico-produtivo revela-se a
fragilidade das atividades agrícolas diante das secas; demandam-se iniciativas de capacitação
para melhor convivência com os períodos de estiagens – inclusive sob a temática ambiental,
em virtude dos desmatamentos de parcelas da vegetação local, do uso inadequado de
agroquímicos e o comprometimento dos recursos hídricos locais. Nas atividades a jusante da
produção primária, verifica-se a reduzida organização e mobilização dos agricultores para a
comercialização dos produtos agrícolas.
Tome-se, por exemplo, a comercialização de frutas. A atividade comumente é desenvolvida
por cada um dos agricultores. Não existem cooperativas ou associações de produtores
voltados para a comercialização. Nesse cenário, reafirma-se a figura do atravessador,
controlando preços e condições de pagamento aos produtores. Por outro lado tem-se o baixo
poder aquisitivo da população, que não favorece a demanda sustentável para os produtos
locais. Torna-se, portanto, mais urgente a ação organizada de produtores para atuar em
mercados no âmbito regional.
Organização de grupos sociais pode se constituir no primeiro passo ao território. De fato, são
observadas na região algumas iniciativas visando às articulações que ultrapassam os limites
municipais. A própria discussão dos problemas dos municípios – que possuem realidades
semelhantes – estimula a mobilização conjunta dos agentes e instituições (sociedade civil,
Estado e organizações não-governamentais). Uma experiência compreende a tentativa de
fusão de diversos conselhos gestores, nos anos 2002/2003 nos municípios de Presidente
Dutra, São Gabriel e Uibaí. Como resultado da descentralização das políticas públicas – que
remonta à Constituição Federal de 1988 – são criados diversos conselhos, tais como de saúde,
educação, merenda escolar, do Fundo Municipal de Apoio às Associações Comunitárias
(FUMAC), etc. (ROCHA; SCHEFLER; COUTO, 2003a). Cria-se também o Conselho
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Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR), no âmbito do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).
A multiplicidade de conselhos justifica-se: normalmente é uma exigência para assegurar a
liberação e gestão de recursos para os municípios. No entanto, como afirma Abramovay,
(2001, p.2): “(...) o simples fato de recursos federais destinados a um município passarem pela
mediação de um conselho formado por representantes da sociedade local já constitui uma
inovação organizacional significativa”. Tal inovação cria as condições para a discussão dos
interesses convergentes dos municípios, configurando-se assim na gênese de um território.
Não obstante os entraves ao melhor funcionamento dos conselhos – notadamente, a
concentração de muitas decisões sobre a figura do chefe do poder executivo, revelando,
muitas vezes, divergências entre interesses dos grupos sociais; além da baixa mobilização e
participação das comunidades e seus representantes – surge nos três municípios a proposta de
um único grande conselho ou conselhão, na definição de técnicos e agricultores locais. A
iniciativa resulta das críticas ao excessivo número de conselhos, que inviabiliza o
funcionamento em virtude de situações como: um mesmo indivíduo ser componente de vários
conselhos, obrigando-o a participar de uma quantidade igualmente excessiva de reuniões; ou
ainda: a atuação desarticulada, segmentada e desvirtuada dos conselhos – muitos buscando
resultados práticos e imediatos, como a liberação de recursos – retirando a perspectiva de
complementaridade das ações (ROCHA; SCHEFLER; COUTO, 2003a).
Com a unificação do conselho, propõe-se que as decisões a serem deliberadas teriam a
participação dos diversos segmentos representativos da sociedade civil organizada, ainda que,
cada representante possa dedicar-se a uma área de trabalho/conhecimento específica. A
proposta, portanto, não implica na eliminação dos antigos conselhos, comitês ou comissões
municipais. Pretende-se que cada um indique um representante para compor o conselho
maior, que discuta e responda por todas as dimensões da realidade local, constituindo-se em
um fórum de encaminhamento das questões municipais. Note-se que a idéia é plenamente
reproduzível na região, bastando verificar o grau de articulação dos agentes, que define o
êxito (ou não) da iniciativa para um projeto territorial.
A viabilidade de um espaço para as discussões das questões municipais ganha contornos mais
nítidos com a criação, em 2003, do Fórum Regional de Debates (Fórum) na região. Segue-se,
dessa forma, a dinâmica que sinaliza o caminho das ações visando à mobilização e a
organização social: criação dos conselhos municipais; unificação destes conselhos; e
ampliação da participação social, articulando diversos agentes da sociedade. Nesse contexto,
o Fórum constitui-se em um espaço institucional, já incorporando a perspectiva territorial, ao
identificar prioridades de ações regionais e o atendimento destas pelo Estado. A esses
objetivos some-se o estímulo à proposição, reivindicação e acompanhamento (nos
municípios) de medidas para o desenvolvimento regional (ROCHA; SCHEFLER; COUTO,
2003b).
A natureza do Fórum permite a participação de entidades diversas, como órgãos
representativos dos poderes públicos, organizações não governamentais, cooperativas e
instituições de agricultores familiares e empresariais, sindicatos patronais e de trabalhadores,
associações comerciais, entre outras. Propostas analisadas e avaliadas pelas instituições
representativas de cada segmento são encaminhadas e deliberadas. Tem-se, como princípio, o
não encaminhamento de interesses individuais e/ou segmentados, mas somente aqueles
decididos coletivamente e que se identificam com as demandas regionais. Encontram-se entre
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os temas recorrentes do Fórum: o combate à pobreza e à exclusão social; incremento de
atividades produtivas, especialmente a agricultura; mobilização dos diversos segmentos da
sociedade para debater as potencialidades, limites e restrições ao desenvolvimento da região
(ROCHA; SCHEFLER; COUTO, 2003b).
As principais dificuldades enfrentadas pelos idealizadores do Fórum estão na resistência
parcial de determinados segmentos sociais em abrir mão de interesses individuais em favor do
interesse comum e nos conflitos entre os agentes participantes. A resistência justifica-se na
medida em que o Semi-árido brasileiro tornou-se alvo de incontáveis programas, políticas e
ações públicas e privadas ao longo das décadas, muitas delas sem quaisquer efeitos positivos
e/ou ainda reforçando e reproduzindo a segmentação da sociedade. Conseqüentemente,
verificam-se conflitos onde se contrapõem as forças políticas mantenedoras do status quo que
influenciam negativamente por não exercerem o controle direto do Fórum e as forças que
buscam, através da gestão participativa, a solução para os problemas locais.
A experiência do Fórum revela que o caminho à incorporação da perspectiva territorial do
desenvolvimento é bastante complexo, porém exeqüível. Depende, primordialmente, do grau
de participação dos agentes sociais. Nesse cenário, ainda que o clientelismo sobreviva –
adaptando-se aos novos valores ou incorporando, parcialmente, as noções de organização,
mobilização e participação da sociedade na condução das políticas – a análise da dinâmica
regional permite que se vislumbre a ampliação dos processos de participativa social. A favor
dessa perspectiva, ressalta-se que o processo de organização social da região tem enfrentado e
sobrevivido à influência de grupos políticos diversos (ROCHA; SCHEFLER; COUTO,
2003b).
Algumas experiências de projeto territorial apresentam resultados práticos no que diz respeito
à assistência técnica e capacitação de agricultores. É o que revela a pesquisa Análise
Territorial da Bahia Rural, executada pela SEI nos anos 2003-2004 (SEI, 2004). A pesquisa
parte do conceito de território enquanto espaço de realização de um projeto político de
desenvolvimento; diferencia os territórios em consolidados e emergentes – de acordo com o
estágio de execução das atividades –; e em prioritários, potenciais e não-prioritários –
obedecendo a critérios como sustentabilidade política, econômica, social e ambiental,
atendimento a segmentos sociais fragilizados e a consistência das ações futuras, ou seja, o
planejamento regional. As informações permitem identificar quarenta e um territórios na
Bahia; na região tem-se o território consolidado de Irecê: grãos e hortifruticultura regional.
O território de Irecê fundamenta-se na vocação agrícola de produção de grãos, principalmente
o feijão, e as novas culturas conseqüentes do processo de diversificação da produção, em
direção às olerícolas (cenoura, beterraba) e frutas. Representa a organização de agricultores
familiares, pequenos e médios empresários rurais, além de comerciantes de insumos agrícolas.
As ações concentram-se na produção e beneficiamento das olerícolas e na capacitação dos
agricultores, inclusive na questão ambiental. Destaca-se a articulação de instituições como
associações de produtores, empresas comerciais, além da Empresa Baiana de
Desenvolvimento Agrícola (EBDA), da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São
Francisco e Parnaíba (CODEVASF) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Note-se que as experiências do conselhão, do Fórum e do território de Irecê ganham nova
dimensão com a orientação política, a partir do pleito presidencial em 2003. Estimula-se a
discussão regional à luz do território com a criação da Secretaria de Desenvolvimento
Territorial (SDT), vinculada ao MDA. Na Bahia, outras instituições incorporam-se nesse
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processo, como a Secretaria de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais (SECOMP). A
partir dos elementos fornecidos por pesquisas como a Análise Territorial da Bahia Rural,
cria-se então o Território de Irecê, observando a mesma conformação de municípios e
denominação já presentes na regionalização econômica e na citada pesquisa executada pela
SEI. Os encontros, oficinas e capacitações visando à disseminação do conjunto de termos e
objetivos iniciam-se em 2003 e têm programação mais intensa nos dois anos seguintes.
Nos encontros discute-se o encaminhamento das ações e, principalmente, as formas de
alocação de recursos federais de acordo com as prioridades do território. Isso por que
programas de crédito como o PRONAF Infra-estrutura e Serviços têm parcelas cada vez mais
significativas do montante de recursos reservadas ao atendimento das demandas territoriais e
não mais àquelas dos municípios isoladamente. Esse aspecto revela as seguintes preocupações
nos territórios: a) Quais são as prioridades? São elas econômicas, sociais e/ou de infraestrutura
básica?; b) Quem define tais prioridades? Uma plenária igualitária, legítima, com
representantes de todos os municípios do território?; e, conseqüentemente, c) Como evitar o
favorecimento a determinadas correntes e interesses, desvirtuando-se das metas territoriais?
Essas questões são de essencial importância pois potencialmente geram descontentamentos e
desconfianças, funcionando como entraves ou mesmo reveses ao território.
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Figura 01. O Território de Irecê.
Fonte: SEI, 2005.
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3. Assimetrias nas articulações políticas: reveses à questão territorial?
Freqüentemente, nas diversas políticas, programas e ações direcionadas ao longo das décadas
para o Semi-árido brasileiro, observa-se a apropriação dos processos e resultados pelo grupo
político dominante nos municípios. Em muitos casos, a execução e/ou liberação de
determinadas linhas de crédito/financiamento somente ganham agilidade com a interferência
direta do poder executivo municipal ou de representantes nas esferas estadual e federal. O
movimento contrário também é comum: projetos de agricultores familiares têm sua tramitação
atrasada ou mesmo encerrada após desacordos e divergências com prefeitos, deputados
estaduais e federais. Isso ocorre por que geralmente os agentes-chave que catalisam os
trâmites junto às instituições relacionadas são oriundos das forças hegemônicas. Dessa forma,
privilegiam-se os segmentos alinhados à orientação política local. Criam-se, portanto,
distorções nos objetivos das políticas, descontinuidades das ações e a centralização das
decisões em poucos agentes, em detrimento do interesse comum.
Com a ascensão da temática territorial do desenvolvimento e as diretrizes para a execução de
políticas públicas, percebe-se que, em muitos casos, a velocidade das mudanças não permitiu
a conscientização dos agentes, agora em uma nova esfera administrativa. Antigas práticas, o
favorecimento e o próprio clientelismo, que não foram completamente apagadas, são
revisitadas para o território, segregando municípios que não tenham força representativa ou
preterindo estes no atendimento das prioridades. No Território de Irecê, relatos de
agricultores, técnicos e outros representantes de categorias sociais revelam acontecimentos
similares que põem em risco a participação dos municípios na legitimação do território
enquanto instituição, espaço de discussão das realidades e dos problemas e soluções regionais.
No princípio dessas questões está a subespacialização do território, considerando as
proximidades geográficas, os inter-relacionamentos e as atividades econômicas dos
municípios. Em Irecê este se configurou no primeiro impasse a ser solucionado, durante as
reuniões para estabelecer as bases do território, ainda em 2003. A tentativa de subdivisão da
região resultou em quatro áreas, formadas pelos seguintes municípios: Área 1) Irecê,
Presidente Dutra, Lapão e Canarana; Área 2) Jussara, Central, Itaguaçu da Bahia e Xiquexique;
Área 3) João Dourado, América Dourada, Mulungu do Morro, São Gabriel e
Cafarnaum; Área 4) Ibititá, Ibipeba, Barro Alto, Barra do Mendes, Gentio do Ouro e Uibaí.
Note-se que tarefa semelhante já estava em execução pela Companhia de Desenvolvimento e
Ação Regional do Governo Estado (CAR, 2002) em sua publicação Programa de
Desenvolvimento Regional Sustentável (Irecê) e, a nova subdivisão regional proposta
apresenta divergências que suscitaram o debate entre os representantes dos municípios
envolvidos.
Têm-se, como exemplos, os municípios de Presidente Dutra, São Gabriel e Uibaí, alocados
em áreas diferentes pelo critério estrito das atividades econômicas mais representativas
(fruticultura, no primeiro; pequena pecuária familiar, nos dois últimos). Os três integram o
raio de influência e se relacionam mais significativamente com Irecê, não justificando, pois, a
separação. Após a modificação da Área 1 – reintegrando os municípios de Uibaí e São
Gabriel – , o município de Canarana é incorporado à Área 4. A consolidação de pequenas
áreas entre os dezenove municípios do território permite observar realidades, demandas e
mesmo prioridades peculiares, que são encaminhadas à Plenária, cuja composição tem a
participação de pelo menos um representante de cada município. Nesse ponto surge o
principal foco de descontentamento e desconfiança com a questão territorial na região.
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A Plenária tem sua concepção complementada pela criação da Comissão, cujo funcionamento
revela a complexidade da resolução dos impasses regionais sob a ótica territorial. Tem-se
inicialmente que as reuniões são realizadas apenas nos períodos de aprovação e recolhimentos
de projetos para a posterior liberação de recursos – federais, como do Ministério das Cidades,
PRONAF, etc. Não há, portanto, a periodicidade dos encontros intermunicipais, aspecto
apresentado como essencial à apuração das necessidades regionais e para a criação da própria
identidade territorial dos municípios.
Discorda-se do funcionamento das reuniões pois, além das restrições acima, outra decisão
importante – a formação dos grupos de discussão que interagem com as instituições de crédito
e financiamento – é tomada ao final das jornadas de trabalho. Nessas ocasiões, a dispersão dos
representantes municipais permite a aprovação dos grupos por maioria simples. Dessa forma,
freqüentemente permanecem os mesmos elementos presentes na Comissão. Esta tem a função
de eleger e encaminhar as prioridades a serem atendidas (liberação de recursos), dentre a lista
debatida por todos os municípios. Esse atendimento se dá conforme votação recebida pelas
propostas durante o processo decisório. A concentração dos primeiros volumes de recursos
em uma unidade esmagadora de mamona (em um município politicamente emergente na
região) desencadeou as discussões nos demais municípios sobre o papel da Comissão do
Território de Irecê. A partir disso, percebe-se a criação de grupos distintos no interior do
território, com maior ou menor grau de articulação política, refletindo-se no atendimento (ou
não) das suas demandas.
Como exemplo destaca-se a implantação de uma packing house – unidade de seleção e
embalagem de frutas – , uma ação para incremento da fruticultura local. Com Presidente
Dutra à frente do projeto – produz-se pinha na região, mas, como visto anteriormente, há
ainda a necessidade de melhor estrutura a jusante da produção primária, envolvendo a
manipulação dos frutos e a comercialização da produção – tenta-se, nas plenárias,
conscientizar os representantes do território da importância do empreendimento. A
configuração dos projetos selecionados nos últimos três anos pode revelar, segundo uma
liderança de agricultores, a descaracterização do território.
Cria-se, então, uma situação triplamente desfavorável para os municípios não contemplados:
estes têm que assistir a apropriação dos resultados positivos das ações pelo grupo
hegemônico; a pulverização dos recursos remanescentes entre as diversas demandas listadas –
prevalecendo também a articulação político-partidária como elemento definidor das alocações
– ; e a constatação de que, projetos anteriormente elaborados e aprovados na esfera municipal
somente terão recursos liberados através do território, ou seja, pelo trâmite descrito.
A necessidade de constatação de resultados imediatos gera insatisfações com a atual
configuração do Território de Irecê. Não obstante a prioridade atendida desempenhe papel
significativo – a esmagadora pode ser o reforço aos agricultores plantadores de mamona,
consolidando uma cultura já adaptada às condições climáticas e com potencial de expansão,
em virtude de todo o incentivo em relação ao biodiesel – , a destinação de recursos para o
estabelecimento desperta o sentimento de que as articulações políticas (continuam a)
determinam (ar) a liberação de recursos, prática de amplo conhecimento na história recente do
desenvolvimento econômico do Semi-árido brasileiro. Ademais, entende-se que a construção
da esmagadora para o fim apontado deveria obter mais ativamente a participação de outras
instituições – a exemplo da Petrobrás – não comprometendo, dessa forma, os recursos para
todo o território.
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Em conseqüência, relata-se o constrangimento dos representantes dos municípios preteridos
em comunicar aos seus representados a recusa (ou pelo menos adiamento) das demandas
propostas. A ocorrência sistemática desses fatos reforça a desconfiança no território. “(...) a
discussão territorial está sendo boicotada por um lobby regional organizado. Se os outros
municípios não contestarem isso e não protestarem nas assembléias, eles [os agentes dos
municípios mais articulados politicamente e que convergem as ações do Território de Irecê]
vão continuar passando por cima da gente (...)”. As afirmações de uma liderança local
revelam que a temática territorial, embora relativamente recente, apresenta grandes desafios
para a efetiva concretização dos objetivos em relação ao desenvolvimento regional.
Mesmo considerando a importância das demandas – aqui claramente concentradas na infraestrutura
produtiva – , percebe-se que a operacionalização do território confunde os agentes.
Atribui-se também esse fato à disseminação acelerada do que seja e de como funciona o
território, a partir de 2003. Após um breve período, tem-se uma profusão de instituições que
passam a utilizar o termo para condicionar a liberação de recursos e demais ações estratégicas,
tais como o desenvolvimento de cadeias produtivas locais. A orientação do governo federal já
está em vigor mas, aparentemente, foram criadas assimetrias de informações, falhas na
comunicação e no entendimento da questão territorial. Desse modo, sobressaem-se os
municípios cujos representantes possuem maior conhecimento a respeito dos caminhos para
alcançar suas demandas individuais. Evidentemente, não se descarta o grau de articulação
política nas esferas estadual e federal como fator facilitador nesse contexto.
Outro aspecto deve ser considerado nessa análise. Conceitualmente, no território observa-se
um projeto político com ações coordenadas visando ao desenvolvimento (SEI, 2004). As
ações envolvem todos os segmentos sócio-econômicos (agropecuária, saúde, educação, etc.) e
ambientais. A associação do desenvolvimento a um grande empreendimento de infra-estrutura
reflete o fato de que grande parte das políticas públicas e dos programas de ações para o
Semi-árido brasileiro focalizou apenas o município, não analisando as capacidades produtivas
e/ou as reais necessidades locais. A disputa política pela localização de tais empreendimentos
intensifica esses efeitos. O território ainda não eliminou completamente a prática, e o que se
observa em Irecê é uma reedição (ampliada) desse debate.
Esse conjunto de acontecimentos apresenta como conseqüência imediata a tendência à
desagregação do território, com o surgimento de articulações independentes entre os
municípios. Isso por que se relata a desistência de representantes municipais, não
contemplados, na disputa pelos recursos federais pulverizados após significativa parcela ser
destinada a um mesmo estabelecimento isolado. São municípios que possuem pouco ou
nenhum benefício com a cultura em questão (a mamona) e partem para a obtenção de
financiamentos de projetos ligados à caprinocultura. A parceria entre os municípios de
Jussara, São Gabriel, Itaguaçu da Bahia e Uibaí para a viabilização de laticínio e frigorífico
com recursos basicamente estaduais revela a alternativa encontrada para contornar o efeito
adverso da constituição do território. A emblemática afirmação “(...) nesse negócio de
território, as coisas [principalmente recursos estatais] estão indo muito para um município e
os outros estão só dizendo amém. [Eu] preferia que voltasse ao que era antes [às articulações
diretas dos municípios e seus representantes com instituições de crédito e financiamento]”,
proferida por um prefeito em uma das reuniões reflete o descontentamento com a forma de
condução do território.
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Os fatos identificados em Irecê são potenciais reveses para a confirmação e operacionalização
do território. As dificuldades emergem pela forma abrupta das discussões sem, por exemplo,
fortalecer aspectos como a legitimação e funcionamento regular das associações de
produtores, cooperativas, além dos próprios conselhos gestores municipais. A passagem para
o território sem considerar essas etapas prévias confunde e desmotiva os agentes diretamente
relacionados com a questão. A constatação do favorecimento a determinados grupos na
definição e atendimento das prioridades regionais cria a percepção de piora da situação,
repercutindo na implementação de alternativas que, no limite, significam a inviabilidade do
território. Some-se à falta de articulação entre as instituições e programas, sejam federais e/ou
estaduais – e da presença proativa do poder público municipal –, no sentido de disseminar o
novo conhecimento de forma completa e uniforme, desestimulando a formação dos grupos
desiguais. Essas ações fazem parte das soluções apontadas pelos próprios representantes
municipais para o Território de Irecê, analisadas na seção seguinte.
4. Soluções para o Território de Irecê.
Diante do cenário analisado, dos entraves e pontos críticos à condução do Território de Irecê,
o conjunto de soluções apresentado envolve as seguintes ações: a) conceituais, de
disseminação do conhecimento sobre territórios; b) organizacionais, demandando esforços em
direção ao melhoramento da atuação dos representantes dos municípios no território; c)
operacionais, no que diz respeito às reuniões e funcionamento da Plenária e da Comissão; d)
a construção e fundamentação de um pensamento mais amplo, incorporando plenamente os
atributos da sustentabilidade e da regionalização do desenvolvimento, não despendendo
energias, recursos, etc., em empreendimentos que somente favorecem um município
isoladamente.
Percebe-se que existe a necessidade de esclarecimento do conceito de território em virtude da
multiplicidade de instituições que passam a utilizar o jargão na construção de suas estratégias
de atuação na região. Apesar do objetivo geral configurar-se na aglutinação de municípios
com realidades comuns, a abordagem, dependendo da instituição, ainda é diferenciada. Citamse
os exemplos do PRONAF Infra-estrutura e Serviços, da CODEVASF, do Ministério das
Cidades, instituições ligadas às questões ambientais, entre outras. A unicidade dos conceitos
permite potencializar o entendimento, tanto pelos agricultores quanto para os demais
interessados. Paralelamente, verificam-se situações onde os representantes de municípios já
incluídos no território encontram-se alheios às discussões. Nesse caso, tem-se como
prioridade a capacitação desses agentes, objetivando melhorar suas participações, reduzindo a
assimetria entre os municípios.
O processo de organização e mobilização dos representantes também se inclui nesse contexto.
A capacitação citada torna compreensível o papel a ser desempenhado e, conseqüentemente,
estimula o comprometimento em relação no território. Tal comprometimento passa pela
solução de um problema ainda observado na região: a participação de um mesmo indivíduo
em vários conselhos gestores, inviabilizando sua presença nas diversas reuniões. Torna-se
imprescindível a construção de um personagem especialmente voltado para atuar no território.
Integrando essas ações, alterar o funcionamento da Plenária e da Comissão constitui-se em
reivindicação recorrente entre os municípios do Território de Irecê. Não se questiona a
existência de tais instituições. Estas são consideradas importantes espaços de discussão das
demandas regionais. No entanto, a atual conformação dos grupos de discussão e condução dos
trabalhos suscita questões como a descentralização das deliberações; a imparcialidade na
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definição das prioridades a serem contempladas com a distribuição dos recursos; e,
principalmente, a criação de mecanismos para que a representatividade no território seja
igualitária. Portanto, a comissão que seleciona e encaminha as propostas – e faz a
intermediação junto aos órgãos estatais – deve necessariamente ser composta por elementos
de todos os municípios, evitando-se desvios das decisões dos objetivos originais.
Finalmente, demanda-se a viabilização de programas que considerem o desenvolvimento de
maneira ampla e não segmentada como freqüentemente se observa. Constata-se a
conscientização desse entrave quando representantes dos agricultores questionam a
implementação de novas estruturas no território; ou simplesmente se proporciona o pleno
funcionamento daquelas existentes, após diversos programas e recursos financeiros e
humanos despendidos. Paralelamente, outro aspecto diz respeito à viabilidade (ou não) da
implantação de estruturas isoladas para o beneficiamento da produção agrícola local,
substituindo-as pelo fortalecimento de unidades centrais em municípios-chave, envolvendo a
região em uma rede de produção e comercialização agrícola.
Essas ações são precedidas pela etapa de elaboração do diagnóstico, considerando desde o
princípio a esfera intermunicipal, regional e/ou territorial. O objetivo básico do diagnóstico –
apontar dificuldades, potencialidades e soluções multidisciplinares – deve ultrapassar os
limites do município, concorrendo à consolidação do Território. Mesmo o viés ambiental,
outrora posto em segundo plano, começa a despertar o interesse de agricultores, preocupados
com os impactos da utilização indiscriminada dos recursos hídricos em projetos de irrigação e
com o desmatamento da vegetação ciliar, ressurgindo como parte de um plano de
desenvolvimento, a partir da preservação dos rios que cortam a região – Rios Verde e Jacaré.
Tal pensamento transcende à idéia muitas vezes predominante em regiões como o Semi-árido
(ações pontuais, muitas vezes desarticuladas) e revela que, apesar das dificuldades, o território
pode se constituir em uma alternativa sustentável administrativamente.
5. Considerações finais
Para o território emergir como alternativa administrativa viável torna-se imprescindível a
concordância dos municípios envolvidos na proposição e execução de estratégias ao
desenvolvimento da região. A atuação de instituições públicas de crédito, financiamento e
capacitação técnica, dentro dessa perspectiva, transfere-se do atendimento às demandas
isoladas para programas mais amplos, envolvendo soluções que perpassem os limites
municipais, considerando as realidades e peculiaridades sócio-econômicas, políticas e
ambientais. Dessa forma, precede à formação do território a organização e mobilização dos
agentes locais, a definição de papéis e de funções a serem exercidas diante do contexto que se
apresenta, onde se tornam incompatíveis práticas como o favorecimento a grupos distintos,
assimetrias de informações e comportamentos tendenciosos.
Entretanto, tais práticas ainda são observadas no Brasil, uma vez que a operacionalização dos
territórios não as eliminou completamente, gerando o desvirtuamento de metas comuns de
desenvolvimento. O caráter recente do processo de intensificação da discussão territorial –
apenas a partir de 2003 têm-se ações mais contundentes nessa direção como, por exemplo, a
criação da SDT – configura-se importante elemento restritivo à questão por revelar
municípios ainda não preparados à do crescimento com integração aos municípios próximos e
que enfrentam problemas similares. Atribui-se essa deficiência a inúmeros programas estatais
que centralizam os esforços nos municípios, estimulando disputas, seja pela localização de um
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empreendimento de infra-estrutura, seja pela liberação de recursos financeiros àqueles
alinhados à determinada corrente política dominante.
Em Irecê tem-se situação semelhante. Embora se identifiquem iniciativas territoriais na região
(conselhão, Fórum e Irecê: grãos e hortifruticultura regional) a execução da política pública
dá-se concretamente com a criação do Território de Irecê, no âmbito da SDT. Recursos
federais são disponibilizados incorporando-se a nova denominação da região, e os primeiros
resultados concretos são avaliados pelos diretamente interessados na questão. Nesse ponto as
deficiências assinaladas tornam-se evidentes e surgem divergências que põem sob suspeita a
manutenção do território. A compreensão parcial dos papéis a serem desempenhados no
território concebe a parcela dos representantes municipais o caráter passivo nas discussões,
permitindo, por exemplo, a manipulação da formação dos grupos que intermedeiam os
interesses do território junto aos órgãos oficiais.
A organização e o sentimento de comprometimento insuficientes durante as reuniões podem
ser apontadas como responsáveis pelo descontentamento em relação à Comissão, no que diz
respeito ao encaminhamento das prioridades a serem atendidas. A concentração significativa
do volume de recursos em empreendimento/município localizado e a conseqüente
pulverização do restante entre os demais participantes estimula a busca, por estes, de soluções
alternativas. A ocorrência de articulações independentes entre os municípios, na busca pelo
atendimento de necessidades não contempladas no âmbito do território oficial, e o próprio
desejo ao retorno aos procedimentos anteriores (articulações diretas entre municípios e órgãos
públicos) indicam a necessidade da reconstrução das relações intermunicipais, reestruturandose
o funcionamento dos espaços comuns de debates e, principalmente, garantindo-se a
representatividade plena e igualitária de todos os municípios formadores do território. O
reconhecimento sem restrições, a legitimação tanto da Plenária quanto da Comissão a partir
dessas observações constituem-se soluções à viabilização do Território de Irecê.
As demais soluções mencionadas alcançam aspectos como a capacitação contínua dos
representantes municipais, cuja dedicação deve ser essencialmente direcionada para o
território; unicidade e integração tanto das abordagens territoriais quanto dos programas
federais e estaduais; ações que considerem a região (envolvendo inclusive a questão
ambiental) e não se sobreponham às existentes, evitando esforços repetitivos, custosos e/ou
desnecessários. O conjunto de soluções apresentado por agricultores e representantes do
Território de Irecê sinaliza a percepção dos problemas enfrentados e os caminhos a serem
seguidos para concretizar o território como alternativa viável ao desenvolvimento da região.
Referências
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perspectivas para o Desenvolvimento Regional no Brasil. Santiago. Chile, 2001.
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Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional, 2002.
ROCHA, Alynson S. ; SCHEFLER, Maria L.N. ; COUTO, Vítor A. Organização social e
desenvolvimento territorial: reflexões sobre a experiência dos CMDRS na região de Irecê -
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Bahia. In: XLI Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural (SOBER). Anais..., Juiz
de Fora (MG), 2003a.
ROCHA, Alynson S. ; SCHEFLER, Maria L.N. ; COUTO, Vítor A. Organização social e
gestão participativa: um estudo de caso no Nordeste Semi-Árido do Brasil.. In: XXIV
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SEI – Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Análise Territorial da
Bahia Rural. Salvador (BA): SEI, 2004. 222 p.
SEI – Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia. Disponível em
. Acesso em 18.10.2005.

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